Catástrofe no Rio Grande do Sul: como a Engenharia pode contribuir para reconstrução?

Catástrofe no Rio Grande do Sul: como a Engenharia pode contribuir para reconstrução?

Por por Simone Tagliani - Via Engenharia 360 - Publicado em 07/05/24

Neste artigo, a autora conta um pouco mais sobre como é estar neste momento no Rio Grande do Sul, fazendo também um resumo da situação ao qual se encontra a capital do estado, Porto Alegre. Confira!

Imagem divulgação Redes Sociais via CNN Brasil

Explicando as causas da tragédia no Rio Grande do Sul

O primeiro dia do mês de maio de 2024, foi o começo do pesadelo do Rio Grande do Sul. Por conta de uma super massa de ar quente que ficou estacionada no centro do país, a chuva chegou aqui com o máximo de intensidade. Em alguns municípios, foram quase mil milímetros de água em um prazo de um ou dois dias, o que poderia ser mais do que o acumulado para o ano inteiro. E, caso você tenha dúvidas de como isto foi parar na Grande Porto Alegre, vou tentar explicar.

O caminho dos rios

Nossa capital fica ao lado de um estuário, que recebe toda a água que vem de vários rios, principalmente com origem na região da serra gaúcha. Falando a grosso modo, o Guaíba é como um bolsão que represa este grande volume de líquido, encaminhado depois para a Lagoa dos Patos e seguindo em direção ao Porto de Rio Grande até desembocar no Oceano Atlântico.

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Imagem Força Aérea Brasileira via CNN Brasil

Resumindo, esta água escorre dos rios para Porto Alegre como se estivesse em um tobogã. Infelizmente, devido ao grande volume de chuva, ela desceu com tanta força que foi arrasando vários municípios pelo caminho, praticamente tirando do mapa cidades como Roca Sales e Sinimbu. Ao redor, as várias montanhas - mesmo sem desmatamento, com preservação de mata nativa -, tendo o solo completamente encharcado, acabaram deslizando, soterrando trechos de estradas e comunidades inteiras até chegar a Porto Alegre.

A maior enchente da história de Porto Alegre

Quando essas águas chegaram à região de Porto Alegre e arredores, elas estavam barrentas, carregando entulhos e outros resíduos de todos os tipos, contaminando a água que abastece milhões de habitantes. Tentando seguir seu percurso natural, em direção ao mar, passou por cima de fazendas e lavouras, até cidades como Eldorado do Sul.

Falhas no sistema

Já em Porto Alegre, as ilhas foram as primeiras a sofrerem com as enchentes. Depois, o centro, que só não sofreu piores consequências por conta do famoso Muro da Mauá, um sistema de contenção que jamais havia sido testado depois da última grande cheia de 1941. Um dos portões de ferro não suportou a pressão e colapsou, alagando bairros como os Navegantes. E dos sistemas de diques da cidade, os do Sarandi e da Fiergs não suportaram a pressão e começaram a colocar água para fora, alagando outros bairros mais.

Aliás, a saber, dique é uma obra de engenharia hidráulica com a finalidade de manter determinadas porções de terra secas através do represamento de águas correntes.

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Imagem divulgação Defesa Civil via CNN Brasil

Vale destacar que parte do centro de Porto Alegre ficou mais alagada do que poderia porque as casas de bombas ficaram submersas e precisaram ser desligadas para não queimar, passando a jogar água para fora. O mesmo ocorreu em outras zonas, como na Cidade Baixa.

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Imagem divulgação Prefeitura de Porto Alegre

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Imagem divulgação Prefeitura de Porto Alegre via CNN Brasil

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Imagem divulgação Redes Sociais via CNN Brasil

Cenário atual

No dia em que escrevo este texto, 7 de maio de 2024, Porto Alegre está no caos. Há falta de água em quase 80% da cidade. Os supermercados estão desabastecidos. Muitos postos de gasolina já não têm mais combustível. As escolas estão fechadas. Os hospitais estão superlotados, sendo que um deles precisou ser evacuado. Há milhares de pontos de coleta de donativos e acolhimento aos desabrigados. Um cenário que se repete em quase 400 municípios no estado.

A força do povo gaúcho traduzida na solidariedade

Tragédia maior nesta história são as pessoas que perderam seus entes queridos. Mas, por graças, tudo poderia ser pior se as pessoas não estivessem se unindo para salvar vidas. Uma corrente muito poderosa do bem se formou para doar alimentos, roupas, colchões e cobertores, materiais de higiene e água - mesmo onde nem se tem mais. Vimos homens e mulheres arriscando suas vidas para resgatar crianças, idosos e animais - aliás, milhares de animais.

O mais chocante desta semana foi ver a presença dos bravos profissionais das forças de segurança e do exército. Particularmente, eu nunca vi tantas viaturas, motos, caminhões de bombeiros, tanques de guerra, barcos, botes, jets esquis, balsas, pranchas de surfe, aviões, jatos, navios e helicópteros na vida. Aliás, a visão e o som das aeronaves era assustador, como se estivéssemos em um cenário de guerra.

O papel da imprensa

Neste momento, tive mais certeza de como a comunicação pode ser a maior tecnologia da nossa era. Graças aos rádios, jornais, sites, redes sociais e televisão, estamos conseguindo, em tempo real, ter notícias dos acontecimentos. Todos os alertas do governo e da defesa civil são logo de conhecimento da maioria da população, ajudando a salvar ainda mais vidas. E é também através dessas publicações que o restante do Brasil entendeu a gravidade da situação, permitindo uma maior arrecadação de doações.

A contribuição da Engenharia para reconstrução do estado

A Engenharia, ou melhor, o conhecimento dos engenheiros será fundamental para a reconstrução do Rio Grande do Sul. Precisaremos refazer pontes, estradas, casas, escolas e hospitais. Teremos que realocar cidades após extensos estudos urbanos. Também recuperar o patrimônio histórico danificado. Fazer os reparos em ruas, calçadas, mobiliário urbano, sistemas de água, esgoto, luz e Internet. Dar o devido destino a milhares de toneladas de lixo - inclusive de carros, casas, eletrodomésticos, móveis e mais. E recuperação de áreas florestais e plantações.

Mais do que isto, precisaremos de estudos que esclareçam como podemos proteger melhor nossas cidades dos grandes desastres naturais. Projetos eficientes para melhoria desses sistemas de proteção já pré-existentes. E planos para resiliência de todo o estado.

Depois que parar de chover e as águas baixarem, veremos claramente o rastro de destruição e daremos início à fase mais difícil, sendo a reconstrução. Só que não será apenas uma reconstrução de engenharia, mas de vidas, de histórias, de alegrias, de saúde, de esperança. No momento, estamos desolados, descrentes, chocados e desorientados. Mas quero acreditar que nosso povo será como no nosso hino "Forte, aguerrido e bravo", conseguindo se reerguer desta que é a maior tragédia natural de nossa história.

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Imagem de Gustavo Mansur, Palácio Piratini, via Agência Brasil 2